quinta-feira, 10 de dezembro de 2020

Melhorar plantas para melhorar dietas:

A biofortificação!


 
A evolução de plantas que se multiplicam por sementes, ocorrida entre 50 a 200 milhões de anos atrás, teve como consequência o desenvolvimento de inúmeros pigmentos fitoquímicos (antioxidantes/polifenois) como mecanismo de defesa dos vegetais. No século XX a identificação das vitaminas A, C, e E enquanto antioxidantes revolucionou o tema e levou à percepção da real importância dos antioxidantes na bioquímica dos organismos vivos, em especial na preservação da saúde humana.

Esses fitoquímicos são responsáveis pela coloração das diferentes partes das plantas. Mas também trazem benefícios para a saúde humana os quais resultam das suas ações anti-inflamatórias e antioxidantes. Adicionalmente, os antioxidantes ativam enzimas que ajudam a restabelecer os níveis celulares de energia que utilizamos. A sua ação anti-inflamatória é focada na inibição de proteínas inflamatórias, que ocorrem quando o sistema imune é ativado. A razão para as plantas terem grande quantidade destes compostos reside no fato de se produzir um grande número de radicais oxidantes durante o processo de fotossíntese. As plantas necessitam destes compostos para se protegerem de lesões celulares. Os pigmentos vegetais, principalmente os carotenoides e os flavonoides, são os principais responsáveis por esta proteção. A pesquisa tem demonstrado que a ingestão destes compostos, presentes principalmente em legumes, frutas e hortaliças pode resultar em proteção semelhante, especialmente quando se ingere uma grande variedade deles.

Há 10.000 anos desde os primórdios da agricultura os egípcios às margens do Rio Nilo cultivavam trigo, cevada, sorgo, favas, lentilhas, grão-de bico e alho-porro integravam o elenco de legumes, ao passo que as frutas mais comuns eram melão, melancia, romã, figo, uva, azeitona, amêndoa, alfarroba e tâmara. Intuitivamente os egípcios se alimentavam corretamente, fornecendo ao organismo uma grande variedade de vitaminas e nutrientes. Atualmente devido ao avanço da ciência, a agricultura é capaz de inserir nas redes de distribuição de alimentos, vegetais e frutas para atender as necessidades diárias de alimentos contendo fitonutrientes. Apesar disso, a ingestão de 60% de alimentos industrializados, aliados ao consumo de refrigerantes com alto teor de açúcar e aliado ao sedentarismo atinge números assustadores de 34% de obesos nos Estados Unidos da América e 24% no Reino Unido.

No Brasil devido à mudança de hábitos alimentares, em especial nas grandes cidades, após a década de 80, pessoas que consomem até 28% de calorias procedente de alimentos processados resultando em 14% dos adultos dessas cidades em 2009 estavam obesas e com problemas de saúde, notadamente diabete.

Em alguns países, onde a oferta de produtos ultra-processados indica níveis de saturação e/ ou rejeição, as empresas estão ajustando a estratégia de ofertas. Por exemplo, anunciam menos sal, gorduras trans e adicionando micronutrientes sintético em alimentos e, em água industrializadas, nutrientes específicos para permitir ao fabricante a anunciar esses produtos como "saudáveis", o que poderá resultar em maiores índices de obesidade, diabetes e doenças crônicas para esses consumidores menos esclarecidos.

Entretanto, um  projeto mundial de biofortificação "HarvestPlus", do qual o Brasil participa há mais de uma década, visa o desenvolvimento de variedades de plantas utilizadas como alimento básico (abóbora, arroz, batata-doce, feijão, feijão-caupi, mandioca, milho e trigo) ricos em nutrientes com maiores teores de ferro, zinco e vitamina A, usando como ferramenta básica os conhecimentos contemporâneos genéticos do melhoramento de plantas que conta com a colaboração de inúmeras instituições de pesquisa e extensão para disseminar esses excelentes resultados alcançados visando contribuir para melhorar nutrição e saúde da população. Recentemente o segundo maior jornal do mundo, de língua inglesa no Reino Unido - The Guardian edição de 18 de julho de 2013 publicou o artigo "Brazil develops 'superfoods' to combat hidden hunger" relatando o sucesso do Brasil neste importante projeto de alimentação natural do povo brasileiro.

quinta-feira, 5 de novembro de 2020

Educação do campo e a concepção ética


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Educação do campo e a concepção ética em Enrique Dussel: reflexões critícas na perspectiva da inclusão social*

Introdução
O presente artigo trata de reflexões teóricas acerca da concepção ética de Henrique Dussel e de suas contribuições ao debate sobre educação do campo. O trabalho faz referência às críticas à ciência moderna feita por Dussel, o qual pontua suas discordâncias na forma de dominação que países europeus propuseram ao sistema global.
A organização eurocêntrica é criticada por Dussel (1994), por entender que essa visão retrata o mito da modernidade, uma vez que a pessoa humana é vista como culpada, excluída e fora do processo de globalização. Nesse contexto, a ética, defendida pelo autor, destaca a existência humana como direito fundamental de se viver em sociedade.
As reflexões do discurso ético Dusseliano nos levam a debater sobre a concepção de educação do campo, na perspectiva de pensar a realidade e a forma de exclusão social que os sujeitos ligados a terra enfrentam no decorrer da história, assim como a busca por uma educação pública de qualidade em seu próprio espaço de vivência.
A ética apresentada por Dussel proporciona reflexões críticas sobre as condições sócio-educacionais vividas pelas pessoas que são afastadas do processo de globalização de maneira intencional, haja vista que as reivindicações das pessoas em favor dos seus direitos são enfrentadas como uma ameaça ao paradigma dominante. Diante disso, no contexto da educação do campo, aumentam os conflitos agrários e se distancia da esperada reforma agrária.
A partir desse pressuposto, Dussel (1995) nos apresenta como ponto de partida a Filosofia da Libertação para um estudo sobre a pessoa humana, uma vez que são consideradas excluídas e afetadas pelo capitalismo. Nesse sentido Dussel (1995, p. 46) destaca que:
Toma como ponto de partida uma realidade regional própria: a pobreza crescente da maioria da população latino-americana, a vigência de um capitalismo dependente, que transfere valores para o capitalismo central; a tomada de consciência da impossibilidade de uma filosofia autônoma dentro dessas circunstâncias, a existência de tipos de opressão que estão a exigir não apenas filosofia da “liberdade”, mas uma filosofia da “libertação” (em forma de ação, em forma de práxis, cujo ponto de partida é a opressão).
Segundo a filosofia da libertação, os povos que vivem marginalizados almejam uma vida digna de se viver com reconhecimento em sociedade, isto é, uma ética humana que lhe proporcione a libertação de um sistema opressor. As pessoas procuram se libertar da dominação que existe, principalmente, no aspecto cultural, político, econômico, educacional e social.
No sistema capitalista, a ética se mostra como autoritária e utilitarista, uma vez que evidencia comportamento discriminatório e preconceituoso da pessoa humana, tudo isso em favor da aparência desenvolvimentista, destinada aos países situados na periferia do sistema mundo, o que constitui a modernidade como uma falácia.
Historicamente, a educação do campo foi vinculada ao descaso e a precarização, porque com a modernização da economia, a maioria de homens e de mulheres se deslocava para as cidades com a esperança de conseguirem melhores condições de vida, porém, mostra a realidade brasileira que tal expectativa resultou em desemprego e aumento da pobreza.
Isso comprova que o sistema capitalista se apresenta excludente e possuem limitações, o que vem ao longo dos anos gerando lutas sociais e econômicas, entre camponeses e latifundiários, causando mortes e aumento da criminalidade no campo brasileiro.
Nessa abordagem, a educação do campo vem ser discutida como o lugar marcado pela diversidade sócio-cultural, étnico–racial e pela multiplicidade de saberes e conhecimentos que são organizados em diferentes estratégias de sustentabilidade, exigindo, portanto, do poder público, políticas públicas inclusivas, que tenham como ponto de partida as condições da vítima e do Outro, que vivem no campo, na maioria das vezes, esquecidos pelo processo de desenvolvimento e pela desvalorização da própria existência como pessoa humana.
Contribuições do pensamento Dusseliano ao debate sobre Educação do Campo
O pensamento e a teoria de Dussel, na perspectiva da Ética da Libertação, contribuem expressivamente na elaboração e no repensar os conceitos organizados acerca da educação do campo. Discorrer sobre uma temática que apresenta princípios e prima pela valorização dos sujeitos que moram, estudam, trabalham, constroem história e afirmam cultura em diversos lugares e espaços brasileiros, demanda certa compreensão para entender também a correlação de forças, onde esses movimentos estão inseridos.
A educação do campo tem sua base ontológica nos movimentos sociais, especificamente no Movimento Sem Terra (MST) e no Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (PRONERA), que organizados na conquista pela terra e por reforma agrária sempre reivindicam melhores qualidades de vida e uma educação, voltada para a realidade de homens, mulheres, crianças e jovens que moram e estudam no campo.
Esse debate se expandiu para além do MST e atualmente assume vários discursos, pois estão presentes diversas vozes: dos Movimentos Sociais, Universidades, Grupos de Pesquisas, agricultores, Secretarias Estaduais e Municipais de Educação e o MEC/SECADI. O Estado se faz presente nessa disputa, o que demonstra uma contradição, visto que as políticas direcionadas aos povos do campo decorrem de ações emergenciais e assistencialistas a qual muitas vezes têm dificuldade de atender a realidade de agricultores, ribeirinhos, indígenas, quilombola etc., visto que apresentam identidades singulares, necessitando urgentemente de políticas públicas voltadas para a inclusão social.
As reflexões da ética, no debate sobre educação do campo, nos remetem pensá-las como princípios, moral de existência da pessoal humana, por exemplo: historicamente, o MST contribuiu na afirmação desse movimento, porém foram marginalizados, excluídos e com direitos violados, sendo visto como coisas, como o Outro e a margem do reconhecimento e do respeito. Nesse sentido, Oliveira (2004, p. 103) complementa que “a ética da libertação para Dussel trata-se de uma ética cotidiana, desde e em favor das imensas maiorias da humanidade excluída da globalização, na presente normalidade histórica vigente”.
A ética defendida na perspectiva Dulsseliana fica a favor da maioria abandonada, recusada e eliminadas muitas vezes por atos violentos, resultando em alguns casos na morte de muitos trabalhadores. Essa fatalidade ocorre quando os movimentos sociais do campo não aceitam os discursos audaciosos de desrespeito, assumidos, em alguns casos, pelo poder público e pelos latifundiários. Desse modo, Oliveira (2004, p. 102) destaca que:
Dussel desconstrói o discurso ético hegemônico e socialmente excludente desenvolvendo um contradiscurso ético – libertador que tem como referência o outro (a vítima), negado, excluído, afetado em seus direitos fundamentais a vida. E com isso, possibilita a desconstrução de discurso e representações que negam da pessoa humana e a denúncia ético-política da exclusão social das diversas vítimas do sistema.
A dominação no sistema global foi marcada historicamente pela exploração e expansão da cultura europeia que tem seu ponto de partida em países, como: França Itália, Alemanha e Inglaterra que, em apropriação aos diversos territórios no mundo, promove formas de vida e de organização social, cultural e política, sendo divulgada para os demais países como a melhor e a mais desenvolvida.
Ao longo dos anos, os povos do campo foram obrigados a conviver com imposições de vida desvinculada da realidade social, tendo influência do capitalismo e da expansão da globalização. Em vista disso, a educação se desenvolveu vinculada ao descaso e a precariedade, pois a modernização da economia implicou em marginalização, desemprego, aumento da pobreza e da criminalidade nos países considerados periféricos.
No Brasil, a expansão europeia apesar de ocorrer por Portugal - país situado na “periferia do sistema mundo” (DUSSEL, 2007), não abdicou de adaptar sua estrutura social e política durante o processo de ocupação das “novas” terras. Um exemplo disso foi a concentração da terra instituída por meio da Sesmaria, a formalização da lei da terra em 1850 que determinava que esta devesse ser uma mercadoria, pois a única forma de ter o acesso legal a ela seria por meio da compra e venda.
A dependência política e social que o Brasil passou em sua história também foi marcante na construção político ideológica dos sujeitos que disputam território no campo brasileiro. Com base nessas reflexões, Souza (2006, p. 28) explica que:
Aspectos contraditórios na sociedade brasileira no contexto das relações sociais capitalistas no campo, permitindo visualizar a organização de processos de resistência sociais e políticas. [...] a grande propriedade ao lado das pequenas; a produção em grande escala ao lado daquelas para o consumo interno; as relações políticas patrimonialistas, um conjunto de características e contradições que possibilitam a compreensão das relações de poder (dominação) e subserviência, bem como os processos de resistência social e política tão presentes em nossa sociedade, ao lado dos processos expropriatórios e de exploração, também característicos em nossa sociedade.
Sobre essas afirmações, vale situar as contradições sociais, educacionais e políticas, assim como a luta histórica dos movimentos ligados a terra que tem início na colonização, mas se consolida no Brasil em1984 com o MST. Apresentar o MST como referência no debate sobre educação do campo, não significa limitá-lo ao mesmo, pois “[...] foram esses os espaços de gênese das políticas que começaram a construir a Educação do Campo” (FERNANDES, 2004), embora esse debate venha, nos últimos anos, ocupando outros espaços e experiências sociais.
O conceito de educação do campo primeiro tem suas terminologias explicadas por Caldart (2002, p. 26) e assimilada pelos movimentos sociais da seguinte maneira: “no campo o povo tem direito a ser educado no lugar onde vive. Do campo, o povo tem direito a uma educação pensada desde seu lugar e com sua participação, vinculada à sua cultura e às suas necessidades humanas e sociais”. Por conseguinte, esse conceito vem sendo incorporado nos diálogos e debates acerca das melhorias educacionais das escolas e da situação em que se encontram educadores e educandos do campo. Nesse sentido Arroyo (2004, p. 29) define que:
É preciso educar para o modelo de agricultura que inclui os excluídos, que amplia os postos de trabalho, que aumente as oportunidades do desenvolvimento das pessoas e das comunidades e que avança na produção e na produtividade centradas em uma vida digna para todos e respeitadoras dos limites, da natureza.
O autor trata a educação do campo de forma prioritária, acreditando na possibilidade de melhores condições educativas as crianças, jovens e adultos que historicamente foram vítimas do descaso e do preconceito. Muitos termos com denominação pejorativa os tratavam como atrasados por sobreviverem da terra e com formas de vida diversificadas, onde latifundiários ansiavam pelo desaparecimento destes.
Assim, pensar a educação, voltada para atender a realidade camponesa, deverá resgatar saberes, vivências e experiências dos sujeitos que necessitam de uma vida digna e valorativa.
O movimento Por Uma Educação Básica do Campo reivindica uma educação que de fato seja construída com os sujeitos que vivem suas realidades especificas, mas o que ocorre é uma inversão e desvalorização dos saberes presentes nas diversidades dos povos da terra, das águas e das florestas. A esse respeito Souza (2006, p. 52) comenta que “muitos dos conteúdos, metodologias e valores transmitidos na escola das cidades apenas discriminam os povos que não estão inseridos nas relações humanas que dão configurações as cidades”.
Essa afirmativa se fundamenta na concepção que foi destinada aos sujeitos do campo, convivendo durante décadas com a exclusão e descaso pelo sistema educacional brasileiro. A relação campo/cidade tem suas marcas no contexto urbano/rural, organização que permeou no país e expôs o conhecimento das escolas urbanas como sendo o mais adequado, desenvolvido e totalmente distante de atingir a diversidade sócio-cultural presente nas diversas regiões.
Essa estrutura tem suas raízes desde o período colonial, quando os europeus chegaram à América, não respeitaram e muito menos veneraram o modo de viver dos indígenas. Segundo isso, percebe-se que o princípio da ética e do direito foram violados, visto que os indígenas nem sequer tiveram o direito de viver como seres humanos.
Desse ponto de vista, Oliveira (2004, p.104) contribui afirmando que “ter a ética como critério de verdade prática e teórica, ou seja, a vida como condição de possibilidade para a ação e para a reflexão”, nesse princípio destaca-se que a valorização da vida e o direito de viver na sociedade são os pontos básicos para a afirmação da alteridade.
As conquistas dos direitos dos camponeses, junto aos movimentos sociais, encontra a concepção dos direitos e princípios éticos expressos nas legislações, especificamente na constituição brasileira e a materialização destes nas políticas públicas direcionadas para a diversidade e o respeito a diferença. Assim, Molina (2008, p. 29) apresenta que:
O respeito à diferença pressupõe, assim, a oferta de condições diferentes. O que, no limite, garante a igualdade de direitos. Vale ressaltar que a dialética da igualdade e da diversidade evidencia elementos básicos e comuns a todos os sujeitos sociais: a unidade na diversidade. Mas, também indica as diferenças entre o campo e a cidade sócio-histórica e uma matriz cultural diferentes, o que os faz demandantes de políticas específicas.
Nesse contexto, Dussel nos apresenta a ética da libertação que designa como uma “ética crítica que parte das vítimas da história” (VILLA, 2000, p. 277). Desse modo, a filosofia da libertação emana da possibilidade da afirmação da alteridade, daqueles tratados pela cultura dominante como recusado, oprimido e que possuem sua cultura suprimida. Com base nessas colocações, Molina (2008) enfatiza a importância da materialização dos direitos aos seres humanos que são expostos nas legislações brasileiras, devendo de fato ser colocado em prática na sociedade, por meio das políticas públicas. Por isso, MOLINA (2008, p. 29) reafirma que:
É a compreensão da ideia do direito a ter direito que fundamenta a ação dos movimentos sociais como demandantes do que está previsto na lei, mas não materializado na realidade social. Exatamente pelo fato de vivermos numa democracia, regime, instituição de direitos, que se fundamenta a legitimidade, a possibilidade da ação de virmos a materializar aqueles princípios que historicamente, como humanidade construímos, que são os direitos, ou seja, independem da classe social; situação socioeconômica; de vivermos no campo ou na cidade; de sermos brancos ou negros; não importa a questão racial, de classe, de sexo: o fato de sermos pessoa humana nos faz portadores desses direitos.
O direito à educação aos povos do campo, demanda disputar projetos de território, visto que nesse mesmo território, temos de um lado os defensores da agricultura familiar: trabalhadores, agricultores, ribeirinhos, camponeses etc. De outro, a expansão degradante do agronegócio, àqueles que transformam a terra em mercadoria, alimentam o mercado externo e fortalecem o poder do latifundiário, provocando, ainda mais, a desapropriação das terras e os conflitos agrários.
Nessa perspectiva, a educação não se constitui isolada, mas integrada aos aspectos da cultura, infraestrutura, trabalho, organização social, política, sustentabilidade e economia, com a perspectiva de obtenção de políticas públicas que ofereça qualidade social para os trabalhadores viverem de forma digna no campo.
A crítica a ciência moderna obteve fundamentação teórica na concepção ética de Enrique Dussel, na perspectiva de refletir sobre a vida da pessoa humana perante a hegemonia europeia a partir da expansão do sistema capitalista.
Historicamente, o surgimento da modernidade se restringiu a países considerados majoritários no processo de desenvolvimento, dentre eles, destacam-se: França, Inglaterra, Alemanha e Itália que durante décadas dividiram o poder e obtiveram domínio total diante dos países situados no hemisfério sul.
Essa forma de dominação é questionada por Dussel, ao expor justificativas filosóficas que rompem com a concepção cartesiana de pensar o conhecimento científico.
Em seus inscritos, Dussel redimensiona o paradigma exposto pela modernidade e apresenta dois paradigmas que convivem no sistema global. O primeiro é o eurocêntrico e o segundo é o paradigma mundial. Os países chamados pelo autor de periferia do sistema mundo estiveram sob domínio de outros que ele designa como centro.
Desse modo, a ética dusseliana trata de uma ética da libertação que olha e escuta os excluídos e marginalizados que, na maioria das vezes, são esquecidos na chamada globalização.
Nesse contexto, estão situados os povos do campo, vivente de realidades específica que necessitam de uma educação que se apresente de forma diversa e plural, atendendo homens e mulheres do campo, como sujeitos que constroem e que possuem história.
A educação do campo, tendo como referência as contribuições da ética dusseliana, destaca que a pessoa humana, primeiro deverá ter direito a vida, princípio fundamental para que possam ser considerados como sujeitos.
Por fim, as reflexões acerca da educação do campo mostram que os sujeitos ligados a terra são historicamente considerados excluídos do processo de desenvolvimento, porém persistem na exigência por políticas públicas que de fato respeitem a integridade social, cultural, educacional, política e econômica. Perante isso, os povos do campo assumem como compromisso ético a denúncia contra a impunidade e a marginalização enfrentada por eles na busca pela reforma agrária e por uma qualidade social que venha atender a diversidade vivida em cada lugar e território onde estão inseridos.
Referências bibliográficas
ARROYO, Miguel Gonzáles. A educação básica e o movimento social do campo. In: ARROYO, Miguel Gonzáles et al. (Org.). Por uma educação do campo. Petrópolis: Vozes, 2004.
CALDART, Roseli Salete. A Escola do Campo em Movimento. In: CALDART, Roseli Salete; BENJAMIN, Cesar. Projeto popular e escolas do campo: por uma educação básica do campo. Brasília: Expressão Popular, 2002.
DUSSEL, Enrique. Filosofia da libertação: crítica à ideologia da exclusão. São Paulo: Paulus, 1995.
______. Ética da libertação na idade da globalização e da exclusão. 3. ed. Petrópolis: Vozes, 2007.
______. El encubrimiento del indio: 1492. Hacia El origen Del mito de La modernidad. Cambio XXI-Colegio Nacional de Ciencias Políticas, México, 1994.
FERNANDES, Bernardo Mançano. MST: formação e territorialização. São Paulo: Hucitec, 2004.
MOLINA, Mônica Castagna. A constitucionalidade e a justiciabilidade do direito à educação dos povos do campo. In: SANTOS, Clarice Aparecida dos. Educação do campo-políticas públicas-educação. Brasília: INCRA, MDA, 2008.
OLIVEIRA, Ivanilde Apoluceno de. Saberes, imaginários e representações na educação especial: a problemática ética da “diferença” e da exclusão social. Petrópolis: Vozes, 2004.
SOUZA, Maria Antônia de. Educação do campo: propostas e práticas pedagógicas do MST. Petrópolis: Vozes, 2006.
VILLA, Mariano Moreno. Dicionário do pensamento contemporâneo. São Paulo: Paulus, 2000.
* Este artigo foi originalmente apresentado no 5º Encontro da Rede de Estudos Rurais, entre 3 e 6 de junho de 2012.
** Imagem: Programa Novos Rurais do Instituto Souza Cruz.

sexta-feira, 18 de setembro de 2020

PSB aprova resoluções sobre fundo eleitoral, escolha de candidatos e prorrogação de mandatos em diretórios

 


Na reunião virtual realizada nesta quinta-feira (11), a Comissão Executiva Nacional (CEN) do PSB aprovou, por unanimidade, resoluções que tratam da gestão do fundo especial de financiamento de campanha, da prorrogação de mandatos dos membros dos diretórios estaduais e municipais, e da formação de coligações e escolha de candidatos em capitais e cidades com possibilidade de segundo turno.

Sobre a divisão dos recursos do fundo eleitoral, a aplicação dos recursos que cabem ao PSB foi definida da seguinte forma: 30% serão destinados exclusivamente às candidatas mulheres do partido ou da coligação; 60% para as campanhas de prefeito, vice-prefeito e vereadores; e 10% serão contingenciados e utilizados no segundo turno das eleições majoritárias.

A distribuição de recursos levará em consideração a prioridade das candidaturas aos cargos de prefeito e vice-prefeito nas capitais e cidades com possibilidade de segundo turno, reeleição dos atuais mandatários, probabilidade de êxito das candidaturas, e também a estratégia político-eleitoral do partido em âmbito nacional e local.

A Comissão decidiu também que, devido à atual crise provocada pela pandemia de covid-19, os mandatos de diretórios e comissões executivas provisórias estaduais serão prorrogados. O mesmo deverá acontecer em relação aos mandatos dos diretórios e das comissões provisórias municipais.

O partido definiu ainda que as deliberações dos congressos eleitorais municipais sobre formação de coligações e escolha de candidatos em capitais e cidades com possibilidade de segundo turno terão de ser submetidas à aprovação prévia da direção nacional, que poderá aprovar, alterar ou anulá-las em caso de desacordo com as orientações político-eleitorais do partido. Sendo assim, essas propostas deverão ser encaminhadas à CEN, cinco dias antes dos congressos. Todas essas deliberações devem, no entanto, serem antes submetidas à aprovação da respectiva Comissão Executiva Estadual.

As coligações deverão ser realizadas preferencialmente com partidos de esquerda e de centro-esquerda, podendo ser ampliadas para formação de coligação com partidos de outros espectros políticos, desde que aprovadas pela CEN. Apoio ou coligação com os candidatos vinculados politicamente ao governo Bolsonaro estão terminantemente proibidos.

O PSB definiu ainda que NÃO apoia a prorrogação dos mandatos de prefeitos, vice-prefeitos e vereadores, e que concorda com o adiamento do calendário eleitoral, especificamente para 15 de novembro (primeiro turno) e 6 de dezembro de 2020 (segundo turno).

Resolução-CEN-005 – Prorrogação Estaduais-municipais
Resolução-CEN-006 – Rio de Janeiro
Assessoria de Comunicação/PSB nacional

Audiência Pública debate as medidas para combater e evitar queimadas no Pantanal

 

Audiência Pública debate as medidas para combater e evitar queimadas no Pantanal

A Assembleia Legislativa do Mato Grosso realizou na tarde desta quinta-feira (17), através de requerimento do deputado estadual Ludio Cabral (PT-MT), audiência pública remota para debater as medidas para combater e evitar queimadas no Pantanal, que também foi transmitida ao vivo pela TV Assembleia e na página www.facebook.com/LudioMT.

A audiência tinha como principais objetivos fazer um diagnóstico sobre a situação das queimadas, caracterização das queimadas no Pantanal, fiscalização, monitoramento oficial e proteção a partir da visão das organizações da sociedade civil e governo.

A Secretaria de Meio Ambiente da CONTAG, a FETAGRI-MT e os Sindicatos locais acompanharam a audiência, que também reuniu pesquisadores, gestores públicos, ativistas, população pantaneira e ribeirinha, entre outros.

Para a Secretaria de Meio Ambiente da CONTAG, a audiência cumpriu o seu papel e foi feito um profundo debate sobre as causas dos incêndios atuais, que medidas precisam ser tomadas para combater as queimadas e prevenir novos focos de incêndio para preservar o Pantanal. Durante a audiência pública foi alertado que, além do Pantanal, grandes áreas do Cerrado mato-grossense estão sendo atingidas pelas queimadas, e que Mato Grosso tem sido campeão em rankings de desmatamento e focos de calor.

Foram mais de 20 expositores(as). Todas e todos destacaram a importância do bioma, o impacto na fauna e flora com as queimadas criminosas, a destruição do Pantanal, os impactos na vida dos pantaneiros(as), e a questão das comunidades desassistidas, principalmente as indígenas e quilombolas.

Alessandra Alves, indígena do povo Guato e presidente da Organização de Mulheres Indígenas de MT/Takina, denunciou que as queimadas geraram perdas muito grandes dentro do seu território, com perda de roça, de casas e das medicações tradicionais, tudo consumido pelo fogo. “Deve-se pensar em estratégicas e em políticas públicas para o Pantanal e para os povos tradicionais e agricultura familiar e que sejam de fácil acesso”, cobrou.

A representante do Ministério Público, Ana Luiza Peterlini, focou que as ações humanas também estão ligadas aos incêndios e cobrou uma ação efetiva do Estado. “Falta ação do Estado para orientar melhor e oferecer alternativas aos produtores que acabam adotando manejos inadequados. É preciso investir em prevenção. Mas, hoje, a prioridade é combater o incêndio. E é preciso identificar os responsáveis”.

A assessora da Secretaria de Meio Ambiente da CONTAG, Hélica Silva, fez uma fala representando a Confederação e elogiou a iniciativa da audiência como um espaço de denúncia, de união e de esforços na defesa do Pantanal e toda a sua rica diversidade. “O Pantanal é um bem precioso do Brasil e do Mundo, e sua preservação passa a ser uma luta e desafio para todos nós. É tudo muito absurdo o que acontece hoje com o pantanal, sendo devastado em grande parte pela ação do homem e pela ganância, na imposição de interesses econômicos acima da vida. O boi não prejudica o pantanal, agora já não dá para dizer o mesmo dos donos das boiadas”, reforçou.

A assessora destacou ainda a responsabilidade do governo federal nesses crimes ambientais. “O governo federal demonstra muita inoperância e falta de vontade política na defesa do meio ambiente. Há uma agenda política em curso, um projeto federal que visa apenas lucros financeiros e apoio político em detrimento da vida humana, da preservação da fauna e flora do bioma pantaneiro. Nenhum governo foi tão devastador para o meio ambiente. Precisamos ter estratégias políticas claras de enfrentamento desse modelo de desenvolvimento em curso, que passa pelo fortalecimento das parcerias, da pressão que precisa ser intensificada junto aos governos para efetivar as ações de proteção e recuperação do bioma. Afinal, o Pantanal é vida, o Pantanal é nosso, e é preciso salvá-lo”, denunciou Hélica.

A audiência também foi prestigiada por membros da Frente Parlamentar Ambientalista, sendo representada pelos deputados Rodrigo Agostinho (PSB-SP), que é o coordenador da Frente, e Nilto Tatto (PT-SP).

FONTE: Assessoria de Comunicação da CONTAG - Verônica Tozzi

PSB e FJM lançam livro com ideias inovadoras para as eleições 2020

 PSB e FJM lançam livro com ideias inovadoras para as eleições 2020

16/09/2020

O Partido Socialista Brasileiro e a Fundação João Mangabeira (FJM), braço de formação do partido, lançaram nesta quarta-feira (16), uma publicação que traz contribuições às candidatas e aos candidatos socialistas nas eleições municipais. O documento estará disponível nos sites e pelas redes sociais do PSB e da FJM.

Com base nas reflexões do processo de Autorreforma do PSB, o livro intitulado “Cidades Criativas – A Autorreforma do PSB nas Eleições Municipais de 2020” oferece ainda conceitos para uma nova fundamentação do socialismo brasileiro.

Com 125 páginas, o documento é organizado em três temas centrais para as políticas públicas das cidades: Cidades Criativas e Sustentáveis, Revolução Criativa na Educação e Transparência, e Gestão Compartilhada numa Cidade Criativa.

“O PSB tem avançado, a cada eleição, com números sempre crescentes de eleitos, certo de que consolidar sua posição nos municípios é muito importante para o fortalecimento nacional do partido”, afirma na apresentação o presidente nacional do PSB, Carlos Siqueira.

As eleições municipais coincidem com o processo de autocrítica dos socialistas, que será concluído em 2021 com o Congresso Nacional do partido.

Para Siqueira, com a possibilidade de “repensar alguns conceitos e a estrutura socialista, todos crescemos”. “Estamos renovando compromissos, validando novas propostas e reforçando conceitos que sempre sustentaram as nossas lutas como, por exemplo, o combate às desigualdades”, afirma Siqueira.

O documento reúne um conjunto de ideias, conceitos e diretrizes colocados à disposição das equipes locais das campanhas do PSB como contribuição à elaboração de programas de governo e propostas para os legislativos.

Para o presidente da FJM, o ex-governador da Paraíba Ricardo Coutinho, o livro demonstra como a “Autorreforma do PSB pode ser útil na formação político-ideológica do debate eleitoral e na construção de proposições para planos de governo municipal”.

Ele destaca a atuação da Fundação para o “aprimoramento dos saberes disseminados no campo socialista”, como a publicação com as 40 práticas exemplares de administrações socialistas, e o curso de Formação em Políticas Públicas e Bases para as Eleições Rumo à Vitória, que reuniu quase 2 mil inscritos, com especialistas e prefeitos do país todo, além de debates, oficinas e cursos internos.

Curso de Formação Política e Técnica sobre a Declaração De Aptidão ao Pronaf (DAP)

16/09/2020 | POLÍTICA AGRÍCOLA
Curso de Formação Política e Técnica sobre a Declaração De Aptidão ao Pronaf (DAP)

A Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (CONTAG) segue realizando e apoiando em todo o país, o Curso de Formação Política e Técnica sobre a Declaração De Aptidão ao Pronaf (DAP). No final de cada Curso está sendo oferecida uma capacitação sobre o Imposto sobre Propriedade Territorial Rural (ITR). Em 2020, a Declaração do ITR vai até 30 de setembro.

O Curso visa promover a universalização do acesso à Declaração de Aptidão ao Pronaf (DAP) para todas as famílias agricultoras que se enquadram na Lei 11.326/2006, de forma que possam se beneficiar de políticas públicas voltadas para o meio rural; e também possibilita a aproximação dos(as) agricultores(as) familiares com as suas entidade representativas (Sindicatos de Trabalhadores(as) Rurais, FETAG´S e CONTAG).

“O Curso permite que os(as) agricultores(as) familiares possam construir estratégias de massificação do acesso a DAP pela agricultura familiar, além de promover a formação política e técnica de dirigentes e funcionários(as) do Sistema Confederativo CONTAG, para que possam emitir a Declaração de Aptidão ao Pronaf (DAP) para a agricultura familiar”, destaca o secretário de Política Agrícola da CONTAG Antoninho Rovaris.

A partir dos Cursos será construída uma agenda de trabalho nos estados e regiões para que todos os Sindicatos estejam qualificados e passem a ser emissores de DAP.

Esta semana, o Curso é realizado para dirigentes e técnicos das Federações e Sindicatos do Maranhão (FETAEMA), do Espírito Santo (FETAES) e do Tocantins (FETAET).

Na semana de 21 a 25 de setembro, o Curso será realizado nos estados de Alagoas (FETAG-AL) e de Sergipe (FETASE).

O Curso de Formação Política e Técnica sobre a Declaração De Aptidão ao Pronaf (DAP) já foi realizado:

De 27 de julho e 22 de agosto de 2020, para dirigentes e técnicos do Piauí (FETAG-PI);

De 24 a 25 de agosto de 2020, para dirigentes e técnicos do Mato Grosso (FETAGRI-MT);

De 27 a 28 de agosto de/2020, para dirigentes e técnicos do Amazonas(FETAGRI-AM) e do Amapá (FETAGRAP);

De 31 de agosto a 4 de setembro de 2020, para dirigentes e técnicos da Paraíba (FETAGRI-PB);

De 10 a 11 de setembro de 2020, para dirigentes e técnicos do Pará (FETAGRI-PA) e de Rondônia (FETAGRO).

Para qualificar o debate e possibilitar um melhor conhecimento aos agricultores(as) familiares sobre DAP, a CONTAG também construiu um Folder, um vídeo, entre outros materiais.

Leia o Folder AQUI

FONTE: Comunicação CONTAG - Barack Fernandes

quarta-feira, 16 de janeiro de 2019

Aves no sertão

Jovens empreendedores rurais lucram 
com a criação de aves no sertão cearense

Não há dia mais movimentado no terminal rodoviário de Pentecoste - município que dista 90 km de Fortaleza (CE), do que a segunda-feira. É quando ônibus, carros, vans e outros transportes coletivos formais e informais, partem com lotação esgotada com destino à capital cearense. Os passageiros são, em sua maioria, jovens rurais em busca de trabalho na “cidade grande”, com esperanças de um futuro mais promissor do que as possibilidades existentes em sua região.

A frota migratória costumava ser ainda maior no passado. Há 10 anos, os jovens das comunidades rurais do sertão brasileiro cresciam ouvindo que as melhores oportunidades para melhorar de vida estavam nas cidades. Lá seria o lugar dos bons empregos, dos melhores salários, com acesso a produtos, serviços e tecnologias.

Enquanto o urbano é associado à modernidade e ao progresso, o rural é entendido como lugar do atraso e da miséria. Assim, desde muito cedo, os jovens aprendiam, até mesmo na escola, que o melhor caminho era deixar suas comunidades para tentar a vida nas cidades. Essa é a trajetória esperada para um jovem de sucesso: deixar a sua comunidade e conseguir um emprego em uma grande cidade como Fortaleza, Recife, Salvador, São Paulo ou Rio de Janeiro.

Todavia, no sertão do Ceará, existem muitos jovens que desejam permanecer em seu torrão de origem. Para isso, mesmo enfrentando muitas dificuldades, tornam-se jovens empreendedores, criando alternativas e estratégias para conseguir permanecer no meio rural e com qualidade de vida.

Exemplo disso é o jovem Alisson Bezerra, de 20 anos, que poderia ter engrossado as filas do desemprego em Fortaleza e figurar nas estatísticas de jovens que deixaram o campo em busca de alternativas de ocupação na cidade. Inicialmente, a falta de interesse pelo meio rural, aliada à questão da sucessão da terra, seriam motivos fortes para a evasão. Ao mirar no futuro, no entanto, ele acabou mudando de vida ao participar do Programa Jovem Empreendedor Rural (PJER) da Agência de Desenvolvimento Econômico Local (Adel).

Alisson reside em Várzea Comprida, comunidade rural de Pentecoste, é filho de agricultores e um jovem nato do campo. Participou do PJER em 2012, onde teve a oportunidade de conhecer vários lugares, empreendimentos e técnicas que podem ser desenvolvidas no meio rural. Durante o programa despertou o interesse pela avicultura caipira, atividade que desenvolve em sua propriedade e que tem gerado renda suficiente para a sua permanência no meio rural e ajudar nas despesas da família.

No PJER, Alisson teve a oportunidade de conhecer melhor os caminhos para se tornar um empreendedor. Aprendeu sobre novas tecnologias e recebeu informações e apoio para iniciar e desenvolver o seu próprio empreendimento.  Com o seu plano de negócios já elaborado, juntamente com sua tia Jocileide Firmiano, também jovem participante do Programa, ele pegou um empréstimo, através do Fundo Veredas (fundo de crédito exclusivamente para jovens empreendedores rurais, gerido pela Adel), para colocá-lo em prática. Contou ainda, com o acompanhamento técnico e orientações da equipe da Adel para vencer os primeiros obstáculos e se manter no rumo planejado, melhorando cada vez mais as suas práticas de produção e comercialização.

Inspirado na história de vida do Neto Ribeiro, um jovem dos muitos que passaram pelo o PJER e que trabalha com produção de aves, Alisson não mediu esforços para enfrentar os desafios e iniciar o seu empreendimento. As condições da propriedade familiar de Alisson também foram muito decisivas para a sua escolha: “Fiz todo um estudo com a ajuda da Adel, calculei e pesquisei muito sobre a atividade e apostei”, afirma o jovem.

Como tudo no início não é fácil, Alisson produziu, nos três primeiros meses, apenas um lote, pois teve problema de mortalidade das aves. Nos meses seguintes, superou esta dificuldade e começou a fornecer 200 kg de carne mensalmente para o Programa Nacional de Merenda Escolar (PNAE) e vender diretamente para o consumidor final da sua própria região. Para atender as demandas, ele produz lotes de 150 animais com escala mensal e hoje tem um faturamento médio de 2.700 reais ao mês.

Além de possuir um empreendimento rural, o jovem participa da Associação Comunitária de Várzea Comprida e Parnaíba e da Companhia de Produção Agrícola de Pentecoste – organização criada por um grupo de produtores de aves. Alisson, Jocileide e Neto são apenas três exemplos de muitos outros jovens sertanejos que estão lutando para ter o seu próprio negócio e desenvolver o seu local de origem.


Para saber mais sobre o PJER, sobre o Fundo Veredas e conhecer outros exemplos de jovens empreendedores rurais acesse www.adel.org.br.



segunda-feira, 3 de dezembro de 2018

Overshoot Ecológico

 
 

A maior urgência política da nossa época é conter a grave crise ecológica. Essa grave crise, gestada no seio da ecologia, é fruto da distorcida visão social do progresso que faz a humanidade correr tresloucadamente em busca da satisfação ilimitada dos desejos materiais; para isso, põe a roda da economia (atividade produtiva) para girar com mais força e rapidez, expandindo a qualquer custo a máquina de produzir suntuosidades. É a sociedade produzindo riquezas (produtos) além do necessário, como bem disse Thorstein Veblen (1857-1929). O motivo? Para que os indivíduos com mais poder de aquisição possam se distinguir uns dos outros.

Essa sociedade de produção e de consumo, na verdade, de hiperprodução e hiperconsumo, produziu em escala mundial o overshoot ecológico (transbordamento), ou seja, esgotou-se o estoque da natureza sob a forma de biocapacidade – o montante de recursos que o planeta regenera a cada ano – e o compara à demanda humana. Transbordou-se o montante necessário para produzir todos os recursos vivos que consumimos e absorver nossas emissões de dióxido de carbono.

Desde 1970, nossa pegada de carbono (quantidade de terra e área marítima necessária para absorver todo o CO2 que emitimos) mais do que duplicou. De acordo com o Living Planet Report 2010, a humanidade usava em 2007 (último ano para o qual se têm dados) o equivalente a um planeta e meio para suportar suas atividades.

E por que isso aconteceu? Porque a economia não respeita (na verdade, ignora) os limites da natureza. A atividade econômica produtiva (o sistema econômico que nada mais é que um subsistema da natureza) ignora as fronteiras ecossistêmicas e obedece cegamente à ordem que emana do mercado que “pede” mais crescimento com mais produção.

Isso resulta na depredação dos vitais ecossistemas, no aquecimento global, na erosão da biodiversidade, na degradação dos recursos hídricos. Lamentavelmente, o sistema econômico não leva em conta a premissa de que mais crescimento físico da atividade econômica significa completo esgotamento de recursos da natureza; em outras palavras, em aumento de entropia (degradação).

Não há como negar: aumento da produção econômica (mais produtos) representa menos florestas, solo, água, ar, clima estável e, no final, mais resíduos e poluição. Para se fazer um hambúrguer de 100 gramas são necessários 11 mil litros de água. A fabricação de um jeans consome 8 mil litros de água e o equivalente a 32 quilos de recursos naturais. Esse raciocínio é bem simples: a partir de certo tamanho da economia, há mais custos (e perdas) socioambientais que benefícios (e ganhos) oriundos da produção material.

Não por acaso, desde os anos 1960, o PIB mundial foi simplesmente multiplicado por cinco; nos anos 2000, o produto bruto mundial cresceu, em média, a um ritmo de 3,7% ao ano; entretanto, desde os últimos 60 anos, a partir do pós-Segunda Grande Guerra, quando se consolida a busca pelo crescimento econômico como paradigma supremo das políticas governamentais, mais de 60% dos principais serviços ecossistêmicos foram destruídos (transbordou) à exaustão.
Vale reiterar: esse “transbordamento” (overshoot) deve ser creditado à estapafúrdia ideia de fazer a economia (um sistema aberto dentro do ecossistema) crescer, entendendo, erroneamente, que diante disso repousa a melhora substancial do padrão de vida das populações.
Com isso, implica-se em mais poluição (a poluição dizima 1,5 milhão de pessoas ao ano ao redor do mundo), mais produção de lixo (o mundo produz cerca de dois milhões de toneladas de lixo domiciliar por dia; são cerca de 730 milhões de toneladas ao ano), considerável perda de ecossistemas/biodiversidade, consumo exagerado de matérias-primas não renováveis, mais e mais emissões de CO2 (se durante os anos 1990 as emissões de CO2 aumentavam ao ritmo de 1,3% ao ano, durante os anos 2000 esse ritmo subiu para 3,3% ao ano) e, claro, como consequência, menos meio ambiente.

A perda de ecossistemas é gravíssima. Para ficarmos apenas num único exemplo: o maior de todos os ecossistemas, os oceanos (mares e oceanos representam 71% da superfície da Terra), estão em corrente processo de esgotamento. O Fundo de Alimentação e Agricultura (FAO/ONU) já declarou que em 2048 não poderemos tirar dos oceanos nenhum recurso alimentar significativo. Mais de 90% dos estoques de peixes predadores de grande dimensão, como o atum, peixe espada e o bacalhau já foram capturados. Entre os anos 1950 e o momento presente, a pesca total em águas abertas e abrigadas passou de 20 milhões para 95 milhões de toneladas métricas.

Período “antropoceno”
As extinções de fauna e flora, fruto da ação antrópica, alcançou ritmo jamais visto no último século; razão essa que levou o Nobel de química, Paul Crutzen, a declarar que desde o final do século XVIII “entramos” no período “antropoceno”, ou seja, na era em que predomina a influência (agressão) humana sobre a biodiversidade. Por tudo isso é urgente à necessidade de reconstruir a sociedade (e, especialmente a maneira como a economia atua em sua relação com o meio natural) em torno de outros valores, longe da sanha consumista.

Se pretendemos alcançar com eficiência a política da sustentabilidade, obrigatoriamente o sistema econômico deverá passar pela capacidade de atingir prosperidade sem crescimento. Uma vez reconhecendo que a pressão humana sobre o sistema ecológico é expansiva e dilapidadora, três fatores precisam ser contornados para essa reconstrução acontecer satisfatoriamente: i) segurar o aumento populacional (em 1900, a população mundial era de 1,5 bilhão de habitantes. 85 anos depois, o planeta atingiu 5 bilhões de pessoas e, em apenas 28 anos depois, o mundo “ganhou” mais 2 bilhões de habitantes); ii) estancar o nível de consumo e, iii) reduzir o uso de novas tecnologias voltadas exclusivamente ao aumento da produtividade do trabalho – base de aceleração da economia.

Esse conjunto de fatores – em especial, os dois últimos - passa por “encaixar” a atividade econômica dentro dos limites dos ecossistemas. A economia não pode mais “funcionar” sob o paradigma do crescimento. Tão importante quanto isso, é o fato da economia neoclássica – fascinada pela ideia de equilíbrio e liturgicamente adepta do dogma do crescimento – reconhecer aquilo que é mostrado com bastante clareza pela segunda lei da termodinâmica (parte da física que estuda as transformações energéticas) que o “circuito econômico” não funciona no vazio, mas dentro da biosfera.

Urge “renovar a economia” substituindo a obsessão material, privilegiando o elo social ao invés da satisfação individual, como bem apontou Hervé Kempf. Por fim, cabe perguntar: seria isso mera utopia? Não! Definitivamente, não. Utopia maior consiste em acreditar que podemos continuar no caminho atual de exploração desenfreada dos recursos naturais e que isso, num breve amanhã, não afetará os destinos da humanidade.
+ Imagem: Paul Turgeon
 


 

quinta-feira, 26 de julho de 2018

O Brasil Também é Quilombola e o IBGE 2020 irá ajudar a mostrar o quanto!

Família Quilombola da Comunidade Quilombola Maria Joaquina, Rio de Janeiro. Foto: Ana Carolina Fernandes
16 de julho de 2018
Uma iniciativa inédita está sendo implementada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o famoso IBGE, responsável pelo recenseamento da população brasileira e organização de dados estatísticos socioeconômicos e demográficos oficiais do país.
Trata-se do levantamento censitário da população quilombola do Brasil. Uma luta antiga do movimento quilombola que agora, através da confluência[i] entre a CONAQ e gestores do IBGE, aliados ao Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA-ONU), e com o apoio de órgãos governamentais como o INCRA, a Fundação Cultural Palmares e a SEPPIR, vem se concretizando e tornando cada vez mais viável o Censo Quilombola de 2020.


http://conaq.org.br/noticias/o-brasil-tambem-e-quilombola-e-o-ibge-2020-ira-ajudar-a-mostrar-o-quanto/

Feirinha São Luís ganha selo comemorativo dos Correios por um ano de atividade

25/07/2018 18h28
Feirinha São Luís ganha selo comemorativo dos Correios por um ano de atividade
Da Redação, Agência São Luís
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O Selo Personalizado é uma homenagem ao aniversário de um ano da Feirinha São Luís, iniciativa da Prefeitura 
Em comemoração ao primeiro ano da Feirinha São Luís, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação e os Correios lançaram nesta quarta-feira (25), o Selo Personalizado em homenagem à iniciativa da Prefeitura de São Luís. O selo circulará no Brasil e no exterior, propagando, por meio de sua imagem, o tema que originou a sua criação. O lançamento ocorreu no Palácio de La Ravardière, com a participação do prefeito Edivaldo, do vice-prefeito, Júlio Pinheiro, do coordenador regional de vendas dos Correios, Silvio Eduardo Silva e Silva, representando no ato o superintendente Ricardo Barros, e dos secretários Pablo Rebouças (Governo), Ivaldo Rodrigues (Gestão Política), Nonato Chocolate (Semapa) e Socorro Araújo (Turismo).
O prefeito Edivaldo comemorou o selo personalizado como ato simbólico das conquistas que envolvem o centro histórico da cidade, que recebe o maior volume de investimento dos últimos 30 anos em obras de revitalização executadas pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), em parcerias com a Prefeitura. "A Feirinha São Luís hoje é uma grande marca da cidade. Esse selo é um marco histórico que muito orgulha nossa gestão", destacou o prefeito Edivaldo.
Criado sob um fundo amarelo, o selo traz a imagem da personificação do agricultor familiar, do artesão e do artista, segurando em suas mãos uma peça artesanal e coberto por uma veste, cuja estampa simboliza a arquitetura de São Luís com seus azulejos, os produtos agrícolas e a riqueza da flora ludovicense. No canto inferior esquerdo a logomarca da Prefeitura de São Luís. No canto superior esquerdo a descrição "1 ano" seguida da frase "Programa municipal de incentivo à agricultura familiar, economia criativa e promoção da cultura, gastronomia e turismo.   
"O selo é algo de importância histórica que vem de séculos atrás, utilizado para consignar uma data histórica ou movimento festivo. Desde o início, demonstramos grande contentamento pelo lançamento do selo comemorativo de um ano da Feirinha São Luís", disse Sílvio Silva e Silva. Segundo o superintendente dos Correios do Maranhão em exercício, a feirinha tem gerado um impacto positivo no centro histórico e na cidade.
Coordenador da da Feirinha São Luís, o ex-titular da Secretaria Municipal de Agricultura, Pesca e Abastecimento, o secretário Ivaldo Rodrigues, disse que o selo personalizado coroa uma ação idealizada pelo prefeito Edivaldo.
"Tenho certeza que a Feirinha São Luís agrega uma série de valores positivos. Considero este ato e o Selo Personalizado de um ano uma celebração. Como peça de importância histórica milenar, o selo é muito representativo. É um momento de extrema importância essa homenagem que a cidade, a prefeitura recebem dos Correios", disse Ivaldo Rodrigues.
A peça filatélica, utilizada no primeiro porte de carte simples, circulará no Brasil e no exterior.
Para Ivaldo Rodrigues, a Feirinha além da geração de renda cumpri a tarefa de revitalizar o Centro Histórico de São Luís. "Tenho orgulho de poder conduzir esta ação", afirmou Rodrigues.
O secretário municipal de Agricultura, Pesca e Abastecimento, Nonato Chocolate, entende que a iniciativa da Prefeitura reflete em todo o comércio do entorno, com ganhos também para instituições como os Correios. "Acredito que está havendo um convergência de ações positivas", disse Chocolate.
SOBRE A FEIRINHA 
Inaugurada em 11 de junho de 2017, na Praça Benedito Leite, a feirinha realizou, até 22 de julho, 59 edições, sempre aos domingos das 7h às 15h. A feirinha tem uma estrutura básica de 90 pontos de empreendimento, sendo 59 barracas comercializando produtos da agricultura familiar e artesanato, 22 bancas de alimentação e mais 11 food trucks. Além de venda de produtos agroecológicos, a Feirinha São Luís tornou-se um ponto de compras.
Para a secretaria municipal de Turismo, Socorro Araújo, a Feirinha São Luís tem impulsionado o setor com um público crescente, principalmente nos finais de semana. "A Feirinha é um produto que traz alegria, desenvolvimento para o Centro Histórico. O turista sente que tem toda uma comunidade fazendo parte deste processo, com atrações, artesanato, gastronomia. Isso é muto importante", observou a secretária.
Como entusiasta do projeto da Feirinha desde seu início, o secretário de Governo, Pablo Rebouças, acredita que, com o selo, a iniciativa terá reconhecimento de todo país.

quinta-feira, 5 de julho de 2018

Benefícios da atividade florestal

Benefícios da atividade florestal para o produtor rural
A exploração comercial do reflorestamento pode ser uma atividade bastante produtiva para o produtor rural, que vem adotando com frequência esta prática na Zona da Mata mineira. Em determinadas situações (condições do terreno, por exemplo) pode ser mais lucrativa que muitas culturas. Neste artigo, os autores apresentam detalhes sobre a atividade, além da comparação do lucro com outros cultivos.
As florestas têm importância para o homem desde a Pré-história. No início, elas eram fontes de alimento e de caça, e a madeira, como lenha, cabo de ferramentas ou de armas. Com o passar do tempo, o homem começou a descobrir novas utilidades para os recursos que a floresta lhe oferecia: utensílios domésticos, construções, veículos, etc.
Atualmente, plantar árvores se tornou uma alternativa muito interessante não só para melhorar a propriedade, como também para aumentar a renda do produtor. Isso porque as florestas exigem pouca mão-de-obra, têm muita utilidade no sítio ou fazenda; ajudam ainda na melhoria do visual e valorizam a propriedade. O reflorestamento é uma atividade lucrativa, porque funciona como uma “caderneta de poupança verde”, que pode virar dinheiro quando o proprietário precisar.

terça-feira, 8 de agosto de 2017

Empreendedorismo no meio rural brasileiro

Cada vez mais ganham repercussão questões sobre o êxodo e o envelhecimento da população rural no Brasil. Os jovens rurais aprendem desde cedo, na escola e com suas famílias, que é na cidade grande que vão encontrar bons empregos, estrutura e as melhores oportunidades para melhorar as suas vidas. Essa é a trajetória esperada para um jovem de sucesso: deixar a sua comunidade e conseguir um emprego em uma grande cidade – Fortaleza, Recife, Salvador, São Paulo ou Rio de Janeiro.

O jovem rural se encontra diante de muitos desafios e incertezas entre “ficar ou sair” da sua comunidade. Entre as dificuldades de permanecer no meio rural há os limites impostos pela escassez da terra, da baixa renda das famílias e, consequentemente, de investimento na produção e acesso a crédito e tecnologias.

Em busca de um novo emprego, melhores salários, estudos e qualidade de vida, muitos jovens rurais brasileiros migram do campo para a cidade na tentativa de alterar suas vidas. Nos últimos 50 anos, o êxodo rural cresceu 45,3% no Brasil. Atualmente, a migração urbana também tem aumentado, mas não supera a evasão do campo. As conseqüências sociais decorrentes dos processos migratórios campo-cidade são inquestionáveis quando se observa, dentre outros, a favelização dos centros urbanos, aumento da criminalização e, em contrapartida, o esvaziamento do meio rural.

Entretanto, na região Nordeste do Brasil há muitos jovens que desejam permanecer em suas comunidades rurais. E buscam alternativas e estratégias para que possam ficar no meio rural e melhorar de vida. Um exemplo é a Adel, uma organização social fundada em 2007 por um grupo de jovens de comunidades rurais do Ceará, que tiveram a oportunidade de ingressar na universidade na capital do Estado. Depois de formados estes jovens retornaram para suas comunidades para investir seus conhecimentos e habilidades em prol do desenvolvimento local sustentável, através da formação e apoio técnico e gerencial a agricultores familiares e jovens empreendedores rurais.

A Adel está mostrando aos jovens rurais que é possível permanecer no campo através do empreendedorismo. Que há excelentes oportunidades de negócios, ainda não exploradas, no meio rural. E que é mais do que possível a convivência sustentável com a realidade local – a partir da potencialização dos recursos naturais e das vocações econômicas relativas a esse ambiente. A Adel está contribuindo para criar exemplos de jovens que ficaram e tiveram sucesso, aumentaram suas rendas e melhoraram suas vidas e de suas famílias – que agora estão sendo referências para outros jovens da região.

Sabemos que é um desafio trabalhar o empreendedorismo no sertão brasileiro em meio às adversidades climáticas e sociais, mas acreditamos que é possível transformar realidades através de conhecimento, incentivo, trabalho em rede e contribuição financeira e gerencial para impulsionar a implantação de uma ideia. As ações da Adel estão organizadas em quatro componentes, que representam as áreas prioritárias em que os jovens rurais e agricultores familiares precisam de maior acesso e apoio para que possam desenvolver suas iniciativas. Acesso a: (1) Conhecimento – formação de recursos humanos locais; (2) Crédito – para o desenvolvimento de negócios rurais; (3) Redes cooperativas – fortalecimento organizativo para governança local das comunidades e territórios; e (4) Tecnologias de informação e comunicação.

A permanência dos jovens no campo e sua inclusão socioprodutiva contribuem para a estruturação e para a agregação de valor das cadeias produtivas regionais – na medida em que os jovens aprendem e aplicam novas soluções e tecnologias e passam a ocupar estágios estratégicos nas cadeias, como de beneficiamento, processamento e comercialização. Os jovens estão mais antenados e próximos aos mercados e conseguem disseminar conhecimentos de modo mais efetivo que os agricultores tradicionais. Os jovens ainda difundem e aplicam técnicas de agricultura sustentável e agroecológica, com a utilização de técnicas menos agressivas em suas práticas produtivas e em seus negócios. A longo prazo, os impactos das ações da Adel incluem o fortalecimento da agricultura familiar, o aumento no nível de renda familiar e a difusão de um modelo sustentável de agricultura para comunidades rurais do Brasil.

Assim, a Adel acredita no jovem como um agente de transformação e de desenvolvimento sustentável. Uma geração de jovens mais comprometida em dar uma nova cara ao sertão brasileiro, às suas comunidades. Essa geração tem a maior escolaridade média da história da região e está mais sintonizada com o que está acontecendo ao seu redor, no mundo, do que nunca. É uma oportunidade para transformar a realidade social, econômica e ambiental do semiárido brasileiro.

De fato, disponibilizar aos jovens rurais um ambiente favorável à constituição da cidadania e condições de vida hábeis de agenciar a integração econômica e a emancipação social é crucial para que se consiga a permanência dos jovens no campo.  Não estou afirmando que os jovens devem permanecer no campo, afinal, eles são livres para escolher onde querem viver. O problema é com quais referências eles fazem as escolhas de “ficar ou sair”? Que percepções eles têm do meio rural? De seu lugar? E da sua família? Outra problemática a ser explorada, é de onde são herdadas suas percepções sobre o mundo rural. Atentando para estas questões poderemos ter resultados mais profundos sobre a problemática do êxodo das jovens, e talvez seja possível indicar alternativas para modificar esse cenário, como a Adel tem feito no sertão cearense.

+ Artigo originalmente publicado no site Mercado de Impacto.

quarta-feira, 15 de março de 2017

Desenvolvimento Rural Sustentável

Aromas do sertão

No município alagoano de Maravilha, o empreendedorismo tem aroma de aroeira, camomila, canela, erva-doce, maracujá e morango. São estas as fragrâncias dos sabonetes artesanais, a base de leite de cabra, produzidos pelas mulheres da Cooperativa Natu Capri. A atividade conta com o apoio da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) e é uma alternativa de fonte de renda para as famílias do semiárido alagoano.

Até a implementação da iniciativa, a maioria das mulheres da região trabalhava apenas no campo. Atualmente, 20 cooperadas participam da ação e já buscam novos horizontes, investindo em educação e formação profissional.

A Natu Capri é uma das beneficiadas pela estruturação dos Arranjos Produtivos Locais (APLs) promovida pela Codevasf desde 2004. Além da implantação da fábrica de cosméticos artesanais, a companhia realiza capacitações e outras ações relativas às diversas atividades produtivas trabalhadas. Os APLs são caracterizados por um número significativo de empreendimentos e de indivíduos que atuam em torno de uma atividade produtiva predominante na região, como a fruticultura, bovinocultura, apicultura, aquicultura e mandiocultura. A estruturação e o fortalecimento dos arranjos produtivos têm forte impacto na vida dos moradores do semiárido.

De acordo com informações da cooperativa, os sabonetes são ricos em vitaminas e hidratantes. Entre medicinais e aromáticos, a linha de produção conta com dez tipos: aroeira, aveia e mel, babosa, camomila, canela, capim-limão, erva-doce, juá, maracujá e morango.
“Trabalhamos com dois elementos fundamentais e disponíveis na natureza: as proteínas do leite de cabra e o aroma das ervas cultivadas na caatinga. O leite de cabra possui um PH bastante semelhante ao da pele humana, com propriedades rejuvenescedora e calmante. Além disso, ajuda a clarear e suavizar a pele”, explica Vitória Marcos, presidente adjunta da cooperativa.

A Natu Capri produz cerca de 500 sabonetes por mês, parte para comercialização direta e os demais ficam reservados em estoque para encomendas imediatas. Os principais clientes estão nas feiras espalhadas pelo estado e também em outros pontos de venda no Rio de Janeiro, São Paulo, Bahia e Minas Gerais. Além dos sabonetes, a cooperativa produz também esponjas vegetais e já existe um plano de expansão da linha de produtos, com a produção de xampus, condicionadores e hidratantes.

+ Com informações da Codevasf e Infoca.

sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

Práticas educativas e juventude rural

Práticas educativas estruturantes do habitus 
da juventude rural no campo da modernização agrícola*
 
Resumo
Esse artigo é resultado de uma pesquisa que objetivou apresentar os resultados da implantação do projeto de extensão “Orientação e instrumentalização de jovens rurais para atuarem como agentes multiplicadores na organização sócio produtiva de seus assentamentos”, financiado pelo Edital MCT/CNPq/CT-AGRONEGÓCIO/MDA - Nº 23/2008 - Programa Intervivência Universitária. F foi nomeada pela equipe executora como Projeto “Jovens Rurais”, terminologia que será utilizada durante esse artigo. Foi desenvolvido nos municípios de Jataí e Perolânida, no Sudoeste Goiano. 


O projeto teve como principais objetivos divulgar e socializar conhecimentos produzidos nos centros especializados, fornecer subsídios práticos para a utilização e instrumentalizar técnica, social e política dos jovens rurais para atuarem como multiplicadores e agentes de desenvolvimento nos seus assentamentos de origem no sentido da transição agroecológica. A metodologia utilizada na pesquisa foi bibliográfica e documental. Utilizou-se todos os documentos gerados durante a execução do projeto. O referencial de análise utilizado é a da Teoria da Prática de Pierre Bourdieu. A pesquisa revelou que práticas educativas presentes no campo da modernização agrícola são influenciadoras na constituição do habitus da juventude rural. Palavras-chave: Juventude rural; práticas educativas; habitus; cultura.

Apresentando o projeto e a pesquisa
O projeto “Jovens Rurais” teve como principal objetivo atender jovens residentes e estudantes em áreas rurais, assentamentos de reforma agrária, com idade entre 12 e 18 anos que demonstrassem experiência e/ou aptidão para ações educativas, extensionistas e organizativas. O objetivo foi divulgar e socializar conhecimento produzido e sistematizado pelos Centros Especializados [1] e fornecer subsídios práticos para sua utilização, por meio do envolvimento e da instrumentalização técnica, social e política dos jovens.


Objetivou ainda instrumentalizar os jovens para atuarem como multiplicadores e agentes de desenvolvimento nos seus assentamentos de origem no sentido da transição agroecológica; estimular o desenvolvimento de habilidades e competências nos jovens dando-lhes treinamento, orientação e acompanhamento a fim de garantir a aplicabilidade do que for tratado nos módulos de vivência; estimular o espírito de liderança e de coletividade nos jovens rurais, com orientação para a organização sócio-política e o desenvolvimento nos seus assentamentos; revitalizar a identidade e a socialização camponesa e resgatar a percepção de suas condições de herdeiros de uma identidade e de uma terra; estimular os jovens na compreensão do lugar que ocupam, de si mesmos e da sociedade, de seus desejos de mudança e da afirmação como membros de um grupo social.

Para alcançar esses objetivos a execução do projeto materializou-se na forma de vivências universitárias por meio da realização de módulos de estudos. Eles funcionaram como momento e local de interlocução entre os jovens e os profissionais qualificados para os temas abordados, com o acesso dos jovens aos laboratórios, experimentos, bibliotecas, grupo de estudos, projetos, programas, dentre outros espaços e atividades da Universidade Federal de Goiás, Campus Jataí.

As vivências universitárias foram orientadas pelas linhas de apoio previstas no projeto: Organização Social e Associativismo; Ecologia, Legislação Ambiental e Utilização de Recursos Naturais; Produção Agrícola, Zootécnicas e Agroecológica. Essas três linhas de apoio permitiram desenvolver ações junto aos jovens rurais na perspectiva da transição agroecológica tendo como pretensão alcançar níveis de organização, de produção, de comercialização, de renda e de qualidade ambiental e de vida mais elevados, gerando condições para a autonomia e a sustentabilidade dos assentamentos envolvidos com o projeto.

Nos períodos de intervalos entre uma vivência e outra houve uma atividade de acompanhamento das atividades desenvolvidas pelos jovens em seus assentamentos de origem. Essas atividades foram monitoradas e supervisionadas pela equipe técnica integrante do projeto. O objetivo foi orientar os jovens na execução das ações desenvolvidas por eles a partir dos conhecimentos adquiridos em cada uma das vivências universitárias.

Durante o período de execução do projeto foram ofertados quatro módulos de vivências universitárias, atendendo 60 jovens entre 12 a 18 anos de 4 assentados de reforma agrária dos municípios de Jataí e Perolândia. O projeto foi implementado e desenvolvido em parceria com esses assentamentos e Universidade Federal de Goiás, Campus Jataí e conduzido pelo Núcleo de Estudos, Pesquisa e Extensão em Agricultura Familiar (NEAF) da UFG/CAJ.
Um dos motivadores para o proposição desse projeto de extensão foi a constatação de que, nessa região, as escolas rurais, nos moldes como hoje está constituída, pouco ou nada tem contribuído com os saberes e fazeres necessários aos jovens que vivem no/do campo. (LEAL, 2008)

As escolar rurais dos municípios atendidos pelo projeto surgiram face as necessidades de apreensão de conhecimento relacionados ao processo de modernização agrícola empreendido no país, e na região do Sudoeste Goiano, a partir da década de 1970. Nesse sentido elas seguem construindo práticas educativas constitutivas de habituscapazes de perpetuar um modelo de desenvolvimento que interessa apenas à agricultura/agricultores capitalistas.

Nesse sentido, o projeto “Jovens Rurais”, foi pensado e executado com vistas a propor práticas educativas que fossem mais significativas para os jovens que estudam, trabalham e vivem no/do campo. Ou seja, nele procurou desenvolver práticas educativas que fizessem mais sentido e significado para os jovens assentados. Buscou-se possibilidades educativas capazes de resgatar valores da cultura campesina, podendo assim, contribuir para constituição de novos habitus, capazes de configurar nesses jovens uma nova cultura [2], de maneira a assegurar a constituição, a consolidação, a manutenção, a reprodução e a conformação de um modelo de desenvolvimento endógeno.

Nota-se que a execução desse projeto de extensão gerou uma tensão no que se refere às práticas educativas. De um lado temos a escola rural que forma na perspectiva de manutenção do status quo, ou seja, de um modelo de desenvolvimento agrícola exógeno. Do outro lado, temos o projeto “Jovens Rurais” que forma na perspectiva de um modelo de desenvolvimento agrícola endógeno.

Partindo dessa tensão gera-se então a necessidade de uma pesquisa que pudesse avaliar os impactos da implantação do projeto “Jovens Rurais”, e são os resultados dessa pesquisa que esse artigo pretende apresentar. Para compreender os impactos da implantação desse projeto na vida desses jovens utilizar-se-á como referencial de análise a Teoria da Prática de Pierre Bourdieu. Por isso categorias fundantes utilizadas pelo autor: espaço social, campo, habitus, capital, entre outras, serão apresentadas.

Referencial teórico
O referencial teórico-metodológico utilizado na pesquisa remete a pensar nas relações que se processam entre a sociedade e os atores sociais, na mediação entre o campo e o habitus, ou entre a estrutura e o ator. Para esse autor a apreensão do espaço social se dá de maneira relacional. Para ele,

É preciso, de fato, aplicar o modo de pensar relacional ao espaço social dos produtores: o microcosmo social, no qual se produzem obras culturais, campo literário, campo científico etc., é um espaço de relações objetivas entre posições [...] e não podemos compreender o que ocorre a não ser que situemos cada agente ou cada instituição em suas relações objetivas com todos os outros (BOURDIEU, 1996, p. 60).

Bourdieu trabalha com duas categorias fundantes em seu esquema explicativo: habitus e campo.Para Bourdieu, citado por Martins (1987), habitus é um sistema de disposições duráveis. A sua existência resulta de um processo de aprendizado, produto do contato dos agentes sociais com diversas modalidades de estruturas sociais. O habitus adquirido pelo ator social, por meio de sua inserção em diferentes espaços sociais, constitui uma matriz de percepção, de apreciação e de ação que se realiza em determinadas condições sociais. O habitus informa a conduta, as suas estratégias de conservação e/ou de transformação das estruturas que estão no princípio de sua produção. Assim, habitus

são sistemas de disposições duráveis e transferíveis, estruturas predispostas a funcionar como estruturas estruturantes, isto é, como princípios geradores e organizadores de práticas e de representações que podem ser objetivamente adaptadas a seu fim sem supor a intenção consciente dos fins e o domínio expresso das operações necessárias para atingi-los, objetivamente “reguladas” e “regulares”, sem ser o produto da obediência a regras, sendo coletivamente orquestradas, sem ser o produto da ação organizadora de um regente (MARTINS,1987, p. 40).

O habitus orienta as práticas individuais e coletivas. Ele tende a assegurar a presença ativa das experiências passadas que, depositadas em cada indivíduo sob a forma de esquema de pensamento, percepção e ação, contribui para garantir a conformidade das práticas e de sua constância através do tempo. Por meio do habitus, o passado do indivíduo sobrevive no momento atual, atualizando-se nas práticas realizadas no presente, e tende a subsistir nas ações futuras dos atores sociais ao confrontar com situações conjunturais nos diversos espaços sociais. Ele torna possível a criação de novas modalidades de conduta dos atores sociais.

Se o habitus orienta a prática [3] dos agentes, esta somente se realiza na medida em que as disposições duráveis dos atores entram em contato com uma situação. Essa situação é denominada em seus trabalhos sobre campo, que é uma outra categoria central em seu esquema explicativo. O campo é um espaço social que possui uma estrutura própria, relativamente autônoma em relação a outros espaços sociais, isto é, em relação a outros campos sociais. Mesmo mantendo uma relação entre si, os diversos campos sociais se definem por meio de objetivos específicos, que lhe garantem uma lógica particular de funcionamento e de estruturação. É característico do campo possuir suas disputas e hierarquias internas, assim como princípios que lhe são inerentes cujos conteúdos estruturam as relações que os atores estabelecem entre si no seu interior. A lógica específica de um campo só é compreensível para aqueles que dele participam.

Segundo Bourdieu (1983), um campo
[...] se define entre outras coisas através da definição dos objetos de disputa e dos interesses específicos que são irredutíveis aos objetos de disputa e aos interesses próprios de outros campos e que não são percebidos por quem não foi formado para entrar neste campo (cada categoria de interesses implica na indiferença em relação a outros interesses, a outros investimentos, destinados assim a serem percebidos como absurdos, insensatos, ou nobres, desinteressados). Para que um campo funcione, é preciso que haja objetos de disputa e pessoas prontas para disputar o jogo, dotada de habitus que impliquem no conhecimento e no reconhecimento das leis imanentes do jogo, dos objetos de disputa, etc. (p. 89, grifo do autor).

Para aprofundar no estudo do campo, faz-se necessário compreender a noção de espaço social [4]. Segundo Bourdieu (1996), o espaço é o “conjunto de posições distintas e coexistentes, exteriores umas às outras, definidas umas em relação às outras por uma exterioridade mútua e por relações de proximidade, de vizinhança ou de distanciamento e, também, por relações de ordem” (p. 18-19, grifo do autor).

O campo é um espaço social com estrutura própria relativamente autônoma em relação a outros campos. Os diversos campos sociais mantêm relação entre si, mas são definidos por objetivos específicos que garantem sua lógica particular de funcionamento e estruturação. O campo possui hierarquias e disputas internas que são compreendidas por aqueles que dele participam. Para o funcionamento de um campo é necessária a existência de objetos em disputa e pessoas dotadas de habitus prontas para disputar. 

A compreensão das categorias habitus e campoé fundamental na medida em que se usa, para fins de análise nessa pesquisa, um campo – o campo da modernização agrícola [5] – na perspectiva de compreender a juventude rural inserida no fenômeno da modernização agrícola no contexto do Sudoeste goiano e a relação de poder existentes nesse campo. O campo da modernização agrícola é um espaço social, como os outros, em que se trata de poder, de capital, de relações de força, de estratégias de manutenção ou de subversão e de interesses.

Segundo Bourdieu, a propriedade definidora de um campo é que todos os agentes que estão engajados nele têm certo número de interesses fundamentais comuns, ou seja, tudo aquilo que está ligado à própria existência do campo, por isso existe uma cumplicidade objetiva subjacente a todos os antagonismos. Pelo simples fato de jogar, de entrar no jogo, a luta pressupõe um acordo entre os antagonismos sobre o que merece ser disputado, e muitas vezes esse fato é escondido por trás da aparência do óbvio, tudo aquilo que constitui o campo, o jogo, os objetos de disputa, todos os pressupostos que são tacitamente aceitos, mesmo sem que se saiba. Os que participam da luta contribuem para a reprodução do jogo colaborando para produzir a crença no valor do que está sendo disputado. 

Os recém-chegados devem pagar um direito de entrada que consiste no reconhecimento do valor do jogo e dos princípios de seu funcionamento, também chamado de investimento. Eles são levados às estratégias de subversão que, sob pena de exclusão, permanecem dentro de certos limites. As mudanças que ocorrem nos campos colocam em questão os próprios fundamentos do jogo sobre os quais repousa o jogo inteiro. Pelo conhecimento prático dos princípios do jogo, todo o passado está presente em cada ato do jogo. Nele, todas as pessoas “compactuam com a conservação do que é produzido no campo, tendo interesse em conservar e a se conservar conservando” (BOURDIEU, 1983, p. 91-92).

O que está em jogo no campo da modernização agrícola é a mudança na cultura e no habitus do camponês; a passagem de uma economia de subsistência para uma economia eminentemente de mercado, tendo como consequência a manutenção de princípios da modernização conservadora, a proletarização e exclusão do trabalhador rural desse processo, agressões à natureza, mudanças na base técnica de produção, inserção de capital financeiro na agricultura, desenvolvimento desigual e combinado, industrialização da agricultura e formação dos complexos agroindustriais. Segundo Bourdieu, dentro de um campo existem vários agentes que são mobilizados por um interesse comum, por uma ideia única. No campo da modernização agrícola, a moeda comum é o processo de modernização agrícola. Ou seja, nesse campo esses agentes se mobilizam em função dessa moeda comum.
Participam desse jogo diversos agentes coletivos. Para efeito dessa pesquisa, serão delimitados apenas aqueles que são considerados significativos, aqueles que possuem capital suficiente para uma participação na luta concorrencial dentro do campo. De um lado o sistema educacional materializado, nesse contexto, nos saberes/práticas educativas transmitidos pelas escolas rurais dos municípios envolvidos na pesquisa. De outro lado os centros especializados materializado, para fins dos resultados dessa pesquisa, pelos saberes/práticas educativas transmitidos pelo projeto “Jovens Rurais”.

Sabe-se que educação, ou as chamadas práticas educativas são constitutivas de habitus. Para compreender essas práticas educativas é preciso ampliar a abrangência do campo educacional e adquirir uma nova concepção de educação.

A educação não é uma ação exclusiva do sistema escolar [...] educação é antes de tudo, formação de consciência, aquisição de conhecimento do real, aquisição essa que se faz em sociedade. Os homens educam-se, adquirem consciência, na relação que estabelecem entre si e com a natureza em condições concretas de vida. A educação, portanto, faz-se, não só na prática escolar, mas nas diversas práticas. (LOUREIRO, 1988, p. 20, grifo nosso)
Interessa aqui evidenciar a educação elaborada a partir das estratégias de ação utilizadas pelos agentes coletivos no campo da modernização agrícola. São as ações dos agentes coletivos, escolas rurais e centros especializados, que são tomadas aqui como educação. A ação desses agentes coletivos é prenhe de intencionalidade, de significações históricas e sociais, constitutivas e constituintes das relações que eles estabelecem entre si. São nessas ações que são reveladas as suas docências.

São nelas que os agentes estabelecem estratégias que asseguram ou não a reprodução e manutenção de seu papel. Elas é que revelam o apoio dado ao avanço da modernização agrícola. É nas ações educativas dos agentes coletivos que é possível perceber se agiram numa perspectiva de reprodução ou de contestação do processo de modernização agrícola no Sudoeste goiano.

Entender essas estratégias como práticas educativas é possível, pois, como diz Brandão (1993), não há uma forma única nem um único modelo de educação. Ela existe em mundos diversos e de diferentes maneiras. Ela existe em cada categoria de sujeitos de um povo, em cada povo, e entre povos que se encontram, e existe entre povos que submetem e dominam outros povos, usando a educação como um recurso a mais de sua dominação.

Em todos os tipos de sociedades, a educação é um dos mais eficazes instrumentos de controle social, quer apareça difusa e não formalizada, quer apareça formalizada. Ela é uma das práticas sociais usadas, com frequência, para controle de ideias e condutas. Os conteúdos dessa educação conduzem a mensagens que legitimam a ordem social. Assim, ao ensinar alguma coisa, ensinam-se os valores de uma ordem social que se impõe ser reconhecida como legítima e necessária, ao mesmo tempo em que se inculcam conhecimentos e habilidades tidas como necessárias e legítimas, para que as pessoas educadas preservem e reconstruam a ordem econômica, política e simbólica da sociedade.

Para Brandão (1990), todo o exercício de educação tem uma dimensão instrumentalizadora. Ela responde a necessidades gerais e especializadas das pessoas, por isso os controladores da educação definem toda a sua prática e determinam o que ela deve ser. Assim, nada é gratuito e nem puramente educativo na educação. Se, em um nível mais visível, ela parece ser pensada e exercida de modo a produzir benefícios diretos ou indiretos para todas as pessoas; em outro nível, o que se esconde sob as realizações do primeiro, ela se soma a tudo que serve para controlar o pensamento, as iniciativas, enfim, a vida individual e coletiva de todos os sujeitos de algum modo envolvidos em suas tramas.

Metodologia utilizada
A metodologia utilizada para o desenvolvimento da pesquisa foi bibliográfica e documental. Utilizou-se todos os documentos gerados com a execução do projeto “Jovens Rurais”, entre eles: projeto, módulos de vivências, apostilas didáticas utilizadas nos módulos, relatórios das vivências, relatórios das visitas técnicas realizadas nos assentamentos, questionários aplicados aos jovens, aos pais dos jovens, e aos membros da comunidade dos assentamentos envolvidos, depoimentos de pais e jovens durante a avaliação de cada uma das vivências, vídeos documentários gerados durante as vivências, cartas, letras de músicas compostas pelos jovens, relatório final do projeto, entre outros documentos.


Resultados alcançados
Opta-se, nesse artigo, por apresentar os resultados obtidos com a implementação e execução do projeto “Jovens Rurais” em três dimensões:

Os resultados dos módulos de vivências - Oferta de quatro módulos de vivências universitárias, com 15 dias cada um; Composição de quatro módulos de vivências com temas específicos de acordo com o interesse e a necessidade dos jovens e seus familiares; Oferta de conteúdos teórico-práticos de acordo com os temas tratados; Acompanhamento, da aplicabilidade dos conteúdos tratados, nos lotes e assentamentos dos jovens; Monitoramento das experimentações realizadas pelos jovens participantes do projeto; Orientação e instrumentalização teórico-prática de 60 jovens assentados, com impacto direto em 48 famílias, aproximadamente 240 pessoas; Multiplicação do aprendizado, por parte dos jovens, nos seus assentamentos de origem, com impacto indireto em 170 famílias, aproximadamente 850 pessoas.

Os resultados técnicos - Compreensão, por parte das famílias, da economia doméstica; Diversificação e aumento da produção e produtividade; Aumento da renda familiar; Diversificação de alimentos para o consumo diário das famílias envolvidas no projeto; Redução dos custos de manutenção do lote e da família; Incremento da criação e do manejo de animais para corte, leite e postura; Articulação para a comercialização da produção dos assentamentos; Formação de multiplicadores dos conhecimentos técnico-científicos tratados durante os módulos de vivência; Uso e aproveitamento de resíduos para a adubação e proteção do solo; Aproveitamento de resíduos orgânicos; Integração de cultivos; Uso de materiais alternativos para construções diversas; Reuso de materiais para a produção de utensílios e artesanatos.

Os resultados sociais - Maior envolvimento dos jovens nas atividades diárias do assentamento; Redução do interesse de migrar para as cidades e abandonar as áreas rurais; Interesse em seus lotes e áreas rurais; Envolvimento nas reuniões das Associações dos assentamentos; Progresso na comunicação com outras pessoas, dentro e fora do assentamento; Melhora da autoestima; Atuação como agentes multiplicadores de conhecimentos nos assentamentos de origem; Melhoria da qualidade de vida; Maior envolvimento com as atividades e a vida escolar; Articulação entre os jovens, dentro do próprio assentamento e entre assentamentos; Organização de eventos sociais como: torneios esportivos, reuniões, festejos e construção de uma biblioteca; Interesse na formação continuada, sobretudo, em fazer curso superior.

Análises e discussões
As estratégias ou práticas educativas desenvolvidas no campo da modernização agrícola pelos dois agentes coletivos analisados, escolas rurais e centro especializado – projeto “Jovens Rurais”, cada um a seu modo, procuram instrumentalizar os jovens com moeda suficiente para entrar numa luta concorrencial, numa disputa por um modelo de desenvolvimento agrícola.

Segundo Leal (2008), as escolas rurais, da forma como foram historicamente constituídas nessa região, assume uma dimensão oca na medida em que é esvaziada de preocupações que operem transformações benéficas reais, ou seja, as práticas educativas presentes no campo se tornaram uma educação que não interage com o estudante rural enquanto tal.
De acordo com Pessoa, “podemos dizer que não existe escola rural, mas que existe no campo apenas um tosco arremedo da escola urbana” e que “a rigor não existe educação rural; existem fragmentos de educação escolar urbana introduzidos no meio rural. A própria educação escolar é, em si mesma, uma instituição emissária do poder que se concentra na cidade e, de lá, subordina a vida e o homem do campo” (PESSOA, 1997, p. 154).

Nessa perspectiva, parece clara a intencionalidade das práticas educativas desencadeadas pelas escolas rurais dessa região. Funcionam como estratégias para conservar o modelo de desenvolvimento agrícola existente no campo da modernização agrícola.
Já o projeto “Jovens Rurais” desenvolveu práticas educativas, desencadeando os resultados apontados acima, que poderiam ser chamadas de contra estratégias ou estratégias contra hegemônicas, pois procurou instrumentalizar os jovens com saberes que possibilitaram um aumento de capital simbólico capaz de colocá-los na luta concorrencial no campo da modernização agrícola.
As estratégias funcionam como investimentos dentro do campo, pois são elas que possibilitam o aumento de capital, segundo a oportunidade que o seu detentor tiver de operar as aplicações mais rentáveis. A razão desse investimento é a acumulação de formas de capital que garantam a dominação no campo, que se apresenta como um espaço de forças. Os agentes em oposição dentro desse campo podem optar por estratégias de conservação ou subversão, de acordo com o seu interesse no campo.
A reprodução dos agentes sociais no campo explica-se pelas múltiplas estratégias que eles mobilizam para a conservação ou a apropriação de capital. Com isso, eles procuram sempre manter ou melhorar sua posição social dentro do campo. Os mecanismos de conservação da ordem social predominam em razão da importância das estratégias de reprodução.

Uma das questões fundamentais sobre o mundo social é saber por que e como o mundo dura, persevera no ser e se perpetua a ordem social, isto é, o conjunto das relações de ordem que o constituem. [...] Pode-se estabelecer uma espécie de quadro das grandes classes de estratégia de reprodução [...] que se encontram em todas as sociedades, mas com pesos diferentes [...] e sob formas que variam segundo a natureza do capital que deve ser transmitido e o estado dos mecanismos de reprodução disponíveis. (BONNEWTZ, 2003, p. 67)
Essas estratégias de reprodução podem ser de diferentes ordens, como as de investimento biológico, de sucessão, de investimento econômico, de investimento simbólico e de investimento educativo. As estratégias educativas visam reproduzir agentes sociais capazes de receber e transmitir a herança do grupo. A eficácia das estratégias de reprodução depende dos instrumentos de reprodução postos à disposição dos agentes.

Considerações finais
Nos termos de Bourdieu, temos no campo da modernização agrícola a formação de um novo habitus. Um habitusagromodernizado (estrutura estruturada) e agromodernizador (estrutura estruturante). Em sua dimensão agromodernizada, as pessoas introjetam e assimilam o modo como as coisas são dentro desse campo; em sua dimensão agromodernizadora, ele passa a ditar o comportamento das pessoas dentro do campo, ou fazer com que elas reproduzam esse habitus. O campo da modernização agrícola dita os novos habitus, e cada um dos agentes passa a reproduzi-lo, ou seja, já estão estabelecidos para cada agente os seus papéis dentro do campo: trazer, manter e reproduzir a lógica do campo.


Essa formação de novos habitus foi possível em função das estratégias de ação adotadas pelos agentes coletivos, especialmente as escolas rurais, no campo da modernização agrícola. Os dados desta pesquisa indicam que o modelo de educação presente nesse campo assume essa dimensão instrumentalizadora, pois se constitui esvaziado de preocupações que possam operar transformações benéficas a todas as pessoas, assumindo um modelo que é utilizado para criar necessidades de consumo dos produtos industrializados na produção agropecuária, sendo que, com esse consumo, dá-se o aumento da produção e o êxito do trabalho educativo.

Todas essas práticas educativas se corporificam no campo da modernização agrícola, tornando-se uma educação que busca atender a determinadas finalidades. Brandão (1990) reforça que a educação pode ter diferentes finalidades e, às vezes, ter usos escusos. Pode ser usada para professar ideias que interessem apenas a determinada parcela da sociedade. A educação existe no imaginário das pessoas e na ideologia dos grupos sociais, e ali sempre se espera, de dentro, ou sempre se diz, de fora, que sua missão é transformar sujeitos e mundos em alguma coisa melhor, de acordo com as imagens que se têm de uns e outros. Mas, na prática, a mesma educação que ensina pode deseducar, e pode-se correr o risco de fazer o contrário do que se pensa que faz, ou do que se inventa que pode fazer.

A inversão, ao menos parcial, dessas situações pode estar diretamente ligada à constituição de novas práticas educativas dos sujeitos históricos que compõem a região estudada, assumindo um (re)redirecionamento desse modelo de desenvolvimento agrícola. Essas práticas educativas foram percebidas na execução do projeto “Jovens Rurais” e são capazes da geração de novos habitus. Novos habitus podem ser constitutivos de condutas que levem a juventude rural deter capital suficiente para entrar numa luta concorrencial dentro do campo da modernização agrícola. Como consequência dessa luta pode-se ter a inversão, ao menos parcial, desse modelo de desenvolvimento exógeno e excludente historicamente constituído nessa região.

Referências Bibliográficas
BONNEWITZ, Patrice. Primeiras lições sobre a sociologia de P. Bourdieu. Petrópolis: Vozes, 2003.
BOURDIEU, Pierre. Questões de sociologia. Rio de Janeiro: Marco Zero, 1983.
_____. Razões práticas: sobre a teoria da ação. Campinas: Papirus, 1996.
BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O que é educação. São Paulo: Brasiliense, 1993.
_____. Pensar a prática: escritos de viagem e estudos sobre a educação. São Paulo: Loyola, 1990.
CUCHE, Denys. A noção de cultura nas ciências sociais. Bauru: EDUSC, 2002.
LEAL, C. R. A. A.. Arapuca armada: ação coletiva e práticas educativas na modernização agrícola do Sudoeste goiano. Goiânia, 2006. 256f. Tese (Doutorado em Educação) – Faculdade de Educação, Universidade Federal de Goiás.
LEAL, C. R. A. A. et.al. Educação rural jataiense: sentidos e significados. In: XVII Simpósio de Estudos e Pesquisa da Faculdade de Educação/UFG, Goiânia – GO, mai. 2008.
LOUREIRO, Walderês Nunes. O aspecto educativo na prática política. Goiânia: Editora da UFG, 1988.
MARTINS, Carlos Benedito. Estrutura e ação: a teoria da prática em Bourdieu. Educação & Sociedade. Campinas, n. 27, p. 33-46, set. 1987.
PESSOA, J. de M. Artigo 28 sem rodeios: a educação rural na nova LDB. In: Fragmentos de cultura. Goiânia, v. 28, n. 7, 1997, p. 149-158.

Notas
* Este artigo foi originalmente apresentado no 5º Encontro da Rede de Estudos Rurais, entre 3 e 6 de junho de 2012.
[1] Considera-se nesse artigo, como Centro Especializado, o NEAF – Núcleo de Estudos, Pesquisa e Extensão em Agricultura Familiar do Campus Jataí da Universidade Federal de Goiás.
[2] Nos textos de Bourdieu, a palavra cultura é tomada geralmente em sentido que remete às obras culturais, aos produtos simbólicos socialmente valorizados ligados ao domínio das artes e das letras. Bourdieu trata da cultura recorrendo ao conceito de habitus (Ver CUCHE, 2002).
[3] Prática em Bourdieu é entendida como produto de uma “relação dialética” entre uma situação e um habitus, isto é, o habitus como sistema de disposições duráveis é matriz de percepção, de apreciação e de ação, que se realiza em determinadas condições sociais (MARTINS, 1987).
[4] Para Bourdieu (1996), espaço social é um campo. “É isso que acredito expressar quando descrevo o espaço social global como um campo, isto é, ao mesmo tempo, como um campo de forças, cuja necessidade se impõe aos agentes que nele se encontram envolvidos [...].” (p. 50)
[5] Campo da modernização agrícola (ver Leal, 2006).